TEXTO, TEXTUALIDADE E ENSINO

Na miscelânea das teorias, na miríade dos nomes e no caleidoscópio das ideias sobre ensino-aprendizagem de língua e literatura, há diversos caminhos possíveis. Este blog propõe esta discussão vista por diversos ângulos.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

REFLEXÕES SOBRE A LINGUAGEM



 REFLEXÕES SOBRE A LINGUAGEM
NOAM CHOMSKY




Chomsky representa, no universo dos estudos linguísticos, ao mesmo tempo um rompimento com o estruturalismo saussureano e com o behaviorismo de Skinner. Embora mantenha, como Saussure, sua atenção voltada ao sistema, Chomsky difere deste ao entender que, antes de ser social, a língua é um elemento individual, no sentido em que se trata de uma capacidade inata do homem.
Ele propõe, ainda, por meio do gerativismo, a ideia de que a partir de um finito número de regras, o falante forma infinitas sentenças. Nesse sentido, o linguista rompe com o behaviorismo, corrente para a qual a língua é aprendida/adquirida por meio do estímulo aplicado a um comportamento esperado. Para o behaviorismo, a língua é um ‘acidente’, isto é, a criança balbucia sons sem significado algum, no meio desses sons, alguns se assemelham a palavras. Ao ouvirem seus filhos balbuciarem tais sons, os pais acreditam ouvir palavras e, a partir disso, passam a estimular seus filhos que, por resposta a um estímulo, começam a repetir tais ‘palavras’ e, então, a falar.
A teoria behaviorista é posta em xeque quando Chomsky comprova que a criança produz muito mais do que ouve. Uma criança, desde a mais tenra idade, é capaz de produzir enunciados que nunca ouviu, fato que evidencia o caráter criativo da linguagem humana. Em decorrência disso, o pesquisador passa a afirmar que a língua é uma capacidade inata do homem, isto é, o homem nasce com o mecanismo linguístico pronto e vai se adaptar à língua falada em seu meio.
Difícil foi para Chomsky comprovar sua tese. Não se pode negá-la, é verdade, entretanto, tampouco podemos prová-la sem que restem dúvidas. Recentemente parece ter sido isolado um gene que seria, possivelmente, o responsável pela linguagem (MARTELOTTA, 2010). Mas tudo ainda é especulação.
Diante da impossibilidade de provar com base na genética o caráter inato da linguagem humana, Chomsky buscou outros recursos. Sua investigação o levou a desenvolver a teoria da Gramática Universal. Segundo essa teoria, há princípios gramaticais que são encontrados em todas as línguas conhecidas. Sem dúvida, há determinados elementos que são recorrentes nas mais variadas línguas, como a capacidade de dar nome às coisas, de indicar a passagem do tempo ou de se fazer referência a algo dito anteriormente, por exemplo. Essa constatação vem reforçar a ideia de que a linguagem é algo inato ao homem.
É inegável a importância de Chomsky para a Linguística. Se há uma falha em seu trabalho que mereça ser apontada ela diz respeito ao desprezo do cientista para com o uso da língua. Chomsky, assim como Saussure, manteve o foco de seus estudos no sistema, na langue (em termos saussureanos) e não no uso (parole). Com o movimento que se chamou de virada pragmática, percebeu-se que estudar a abstração sistêmica a fundo só pode ter como resultados teorias também abstratas que pouco ou nada dizem sobre os sentidos emergentes nas interações sociais. De que adianta entender só o sistema se o uso cotidiano o reinventa a todo instante?
Numa disputa entre Semântica e Pragmática na constituição dos sentidos, penso que ambas perdem se isoladas e só têm a ganhar se unidas. Não é possível pensar apenas de modo sistemático, entretanto, não se pode, também, renegar completamente o sistema. Existe, inegavelmente, um significado ‘neutro’ para as palavras e sentenças, um significado, digamos, livre das nuances do contexto. Esse significado, entretanto, para ganhar sentido, precisa ser efetivado numa situação real de uso, ganhando, em decorrência disso, peculiaridades novas, sutilezas invisíveis ao olho do sistema.
Quantos sentidos há em um simples “a porta está aberta”. É uma permissão para entrar em um recinto? Um pedido para que alguém feche a porta? Uma ordem para que alguém se retire? Ou uma observação de que alguém se esqueceu de fechar a porta? Os sentidos só são efetivados no uso real da língua. Não podemos, entretanto, negar que todos os possíveis sentidos acima elencados partem dos conceitos de ‘porta’ e de ‘aberta’ – sem os quais, não se teria entendimento algum.


BIBLIOGRAFIA

CHOMSKY, N. Reflexões sobre a linguagem. São Paulo: JSN, 2009.
MARTELOTTA, M. E. (org.) Manual de Linguística. São Paulo: Contexto, 2010.








5 comentários:

  1. LSF. Por tais razões, a Linguística Sistêmico Funcional foi minha escolhida, na perspectiva da Linguística Aplicada.

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  2. Hum, belo texto. Mas vem cá, claro que nem me lembro tão bem, mas o modelo das funções da linguagem do Jakobson não trata disso? Dei uma pesquisada muito da rápida pra lembrar mais ou menos, da questão do contexto, ele afirma que sem contexto não há comunicação. Será que existe mesmo o neutro? Tô aqui bolada... :) (Lisandra)

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  3. Então, Lisandra, quando eu falo em sentido 'neutro' (com destaque de propósito), não estou pensando em comunicação, mas numa espécie de sentido estático ou engessado. Aquele significado dicionarizado, a priori de qualquer comunicação. Há um significado inerente ao termo, digamos, sem o qual não poderia, como digo no texto, haver os outros sentidos que emergem no/do contexto - é disso que falo neste trecho do texto. Os sentidos contextuais ora expandem este significado, ora o corroboram ou ainda podem negá-lo, mas, inegavelmente, partem dele.
    Obviamente, apesar de já ultrapassada, a teoria de Jakobson acerta ao considerar o contexto como um dos elementos da comunicação. Todo processo de interlocução acontece inserido num contexto; é neste contexto e, a partir dele, que acontece a construção de sentidos (de modo oral ou escrito - a Linguística Textual também discute questões contextuais). Todas as teorias de cunho sistêmico-funcional, da ordem do pragmático, do uso social da língua, partem da noção de contexto como nuclear para a comunicação, sem dúvida. Jakobson, entretanto, peca ao conceber papéis estanques para os interlocutores. Sabemos, principalmente a partir de Bakhtin, que todo enunciado é sempre dialógico e que, a partir do conceito de 'atitude responsiva ativa', não há elemento passivo na comunicação. Não há, portanto, um sujeito que seja apenas receptor como o esquema dele propunha.
    É isso, amiga, você está certa, em comunicação, não há 'neutro', mesmo. Tudo é contextual e os sentidos são construídos na interação.
    Espero ter de desbolado um pouco... hehehehe

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  4. Eu concordo com a teoria do Chomsky, mas, em termos linguísticos, não paro de pensar em outras possibilidades da aquisição da linguagem. Acredito sim, que já nascemos com algo que nos permita a linguagem até que adquiramos uma língua. Porém, não descarto a teoria de Skinner, mas ela faz uma certa junção com a de Chomsky. Posso estar falando besteira, mas acho que mesmo que nasçamos com (chamemos assim) "O Dom", creio que precise de um certo incentivo à linguagem (ou posso ter confundido todas as teorias). Creio que mesmo que uma pessoa cresça e viva isolada do mundo moderno, onde as pessoas falam pelos cotovelos, e que a comunicação é de suma importância, resumindo, mesmo que ela não tenha contato com nada nem ninguém, de alguma forma, ela irá criar seu próprio meio de comunicação. Então, se for esse o caso, minha ideia do condicionamento é apagada. A AQUISIÇÃO DE LINGUAGEM É MUITO CONFUSA!!!

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  5. Muito interessante a sua reflexão professor Leandro.
    Me sinto muito direcionado ao estudo da linguagem pelo ponto de vista de Chomsky. Acredito que a linguagem humana esteja inata em cada um de nós e nós a desenvolvemos com o tempo, mas não necessariamente sob o ponto de vista do Behaviorismo que através de suas práticas traz um possível maior leque de léxicos, variações linguísticas, dentre outros através de repetições e/ou estímulos.
    Como graduando, penso que Chomsky deveria levar em conta a parole saussureana e talvez até mesmo tender mais aos estudos de Vygotsky, com a ideia de que através da interação, o ser humano aprende a trabalhar melhor as suas faculdades comunicativas dentro de sua própria língua nativa e se tornar um poliglota da própria língua, como cita Evanildo Bechara.

    Raphael Mazza - 3° período Letras - IFSP.

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